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"Todas as tentativas de tornar as coisas compreensíveis se fazem por meio de teorias, mitologias e mentiras."
(H. Hesse).

terça-feira, 26 de outubro de 2010

A ARTE É UMA ILUSÃO



               Arte é o que nos move, motiva pensamentos e sentimentos de criação análogos.
Pensava nisso, quando me ocorreu a figura de Marilyn Monroe. Atriz ícone do cinema estadunidense, morta aos 36 anos.
     Utilizo sua figura pelo acréscimo de simbolismo que ela mantém, pelo ultrapassar das modernas definições que sua arte alcançou. Utilizo a forma arquétipo mais presente em nossas lembranças, o sexual. Porque mais comum, porque mais fácil de reconhecer.
     As três fotos a mostram em fases distintas da carreira. Jovem estrelinha, estrela e em sua última foto, na verdade uma de uma série de muitas, tiradas pela Life, semanas antes de sua morte e só publicadas após seu passamento.
     Marilyn surge como o símbolo perfeito para a era que se descortinava. Sua morte em 1962, a de Kennedy em 1963 e a chegada dos Beatles em 1964, pontuam e deflagram os anos 60, por sobre as tumbas do Vietnã. Sobrevivendo como égide, a Guevara, Elvis, James Dean, sua figura significa e exemplifica agora, o que nunca foi, uma época que não lhe pertenceu de fato, uma liberdade que só viria logo depois que dobrasse a esquina da vida. Mesmo não tendo seus filmes no circuito televisivo popular, uma mostra de suas fotos recentemente, exposição do fotógrafo Albert Stern, lotou os lugares onde foram exibidas, aqui no Brasil.
     Escândalos ajudam, por certo, sexo também, mas é sua aura ainda a exalar a modernidade que outros “ícones” perderam,que clama por análise. A causa de sua morte, envolta em mistério, pretenso relacionamento com Kennedy, envenenamento, os abusos que teria cometido e que teria sofrido, sua mãe louca, o pai desconhecido, nada enevoa sua aura, antes, a amplia.
     Assim como Dean, esmerava-se para manter sua técnica e aprender mais. Já estrela, cursou o Actors Studio, para livrar-se da Fox, fundou sua produtora. A diferença residia em sua inabalável crença, crença na arte. A leitora compulsiva permanece uma desconhecida, quando poemas e anotações suas são publicadas, ainda a pouco, não surpreendem a quem pôde antever.
     Marilyn queria soar real, mais do que parecer, ser atriz. Era um paradoxo constante, que só faria sentido pouco depois de sua passagem com a chegada da contra cultura. Tinha perfeita noção de ser um personagem, referia-se a si mesma, quando em reuniões de negócio, na terceira pessoa. Criou o símbolo Marilyn, baseado em outras atrizes que a antecederam, mantinha em seu camarim, uma foto de Jean Harlow, a loura platinada, mas ampliou e fundou ao quase estado de espírito do que seria “ser uma loura” para todo o sempre: positiva ou negativamente. Construiu-se como mito. Trazendo da vida, o que as pessoas queriam ver. A idealização de seus sonhos, libidinosos que sejam. O fetiche certo para uma época de ouro da arte, que em suma fetiche também o é.
     Elvis ainda vende discos CD, tanto quanto Hendrix. Dean, de vez em quando, tem seus filmes comentados e a pouco, foram feitos novos estudos acerca de seu acidente, revelando sua culpa na colisão que o vitimou. Guevara, que foi inspiração rebelde durou pouco. Os novos ares do mundo não sopram mais idealismo vazio, todavia transformou-se em decoração de loja, cercado de bandeiras vermelhas. Contudo, majoritariamente, dependem do mercado dos Estados Unidos para se manterem como figuras do mito, mitos mortos então, cada vez mais definitivamente, enquanto ela permanece mais do que lembrança, estado de espírito, os outros retidos em seus escaninhos datados, ela etérea.
     Qual mulher que nos 50 e 60, reconheceria que gostaria de ser como Marilyn? Poucas nos EUA. De qualquer forma, logo depois estavam queimando os sutiãs, encurtando saias e vestidos, fumando, declarando o amor livre. Pode-se entronizar Mary Quant, Betty Friedan, Indira, Pagu, mas libertadora mesmo foi Marilyn. Engraçada, sensual, ingênua, linda, bonita, meio feiosa, faladora, a todos os estereótipos da comédia ligeira, ela percorreu (e não entenda comédia aqui, como graça do riso). Claro, que com toda a dor que esse tipo de libertar acarretou. Mas hoje aqui estão elas, com todos os dividendos e resgates da vida mais moderna, que Marilyn ajudou-as a vivenciar. Não fosse os americanos um povo tão esquisito, reconheceriam seu pioneirismo, trabalhando na indústria da mimese por primazia, não se furtava a escancarar suas intimidades, enquanto os Rock’s Hudson’s escondiam-se, isso sem perder nada de sua graça e fama. Uma artista, ainda a outorgar sua inspiração, há tantas pelo mundo. A transgressora por excelência, para um mundo já cansado de transgressões.

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